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domingo, 15 de julho de 2012

Revolução Constitucionalista de 1932 - Quando perder é vencer

Com mais de 600 paulistas mortos, o resultado do embate entre as forças constitucionalistas e o governo foi considerado uma vitória moral

Ilka Stern Cohen 

“Revolução! Precavenha-se fazendo suas compras da margarina Elza...” Esta propaganda, estampada no Diário Nacional em 1930, mostra como a perturbação da ordem invadia o cotidiano do país naquela época. De fato, entre 1920 e 1930, a ideia de revolução permeava o debate político e pairava sobre a sociedade brasileira. Militares demonstraram sua contrariedade em 1922 e em 1924, ao marcharem contra o governo federal, e um grupo de rebeldes militares percorreu o país em nome da revolução entre 1925 e 1927. Nas grandes cidades, o descontentamento de parte da população se manifestava em greves e inquietação. 

Publicado no segundo semestre daquele ano, o anúncio de margarina permite compreender o clima do momento: uma sucessão presidencial complicada, a duvidosa vitória da situação e os insistentes boatos de revolução, que se concretizaram finalmente no golpe político-militar que destituiu o presidente Washington Luís e suspendeu a ordem constitucional. O grupo que se instalou no poder – liderado por Getúlio Vargas – fechou as câmaras legislativas estaduais, dissolveu os partidos e substituiu os presidentes dos estados por interventores federais. 

Os maiores derrotados pelo golpe foram os políticos que se alternavam no poder de modo a se perpetuarem no governo do país. Desde o início do regime republicano, esses grupos mantinham o controle do processo eleitoral, com destaque para os Partidos Republicanos de Minas Gerais e de São Paulo, imediatamente desalojados.



Contra os inimigos da pátria
Para vencer os “rebeldes paulistas” o governo Vargas contou com a participação decisiva das tropas enviadas do Norte

Raimundo Helio Lopes 

“Não queremos ser e não seremos mais escravizados pelos mesmos senhores da politicalha que arruinou a moral republicana em quarenta anos de escândalos e crimes”. Assim o interventor paraense, Magalhães Barata (1888-1959), expôs sua visão sobre omovimento armado ocorrido no estado de São Paulo entre os meses de julho e outubro de 1932 para derrubar o Governo Provisório de Getulio Vargas e promulgar uma nova Constituição. O que estava em marcha era entendido como parte de uma luta maior, que envolvia a consolidação da moralidade pública e política à qual acreditavam ter dado início com a retirada de Washington Luís do Palácio do Catete em 1930. A vitória paulista no conflito significaria o retorno do “perrepismo” – referência ao Partido Republicano Paulista (PRP) – e dos “sombrios tempos” da Primeira República, que desalojara o Norte do palco da República brasileira.

O 9 de julho de 1932 não levou só à população paulista e às suas lideranças civis e militares as tensões, os medos e as incertezas típicas de tempos de guerra. Todo o Brasil passou a viver, a partir desse dia, ainda que de modo distinto do que ocorria em São Paulo, o clima de uma guerra civil. Além do forte papel da imprensa – que noticiou e mobilizou todos os estados da federação em torno dos combates que ocorriam principalmente dentro das fronteiras paulistas –, também os chefes militares nacionais e os governadores estaduais ou interventores estiveram à frente da defesa de Getulio e de seu Governo Provisório.

No caso do “Norte” – que corresponde às atuais regiões Norte e Nordeste, acrescido do estado do Espírito Santo –, o envolvimento com a guerra foi intenso e marcado por diversas estratégias de combate, algumas plenamente executadas, outras, nem tanto. Os interventores nortistas eram, então, nomeados por Vargas, sob forte influência do tenente Juarez Távora (1898-1975), principal líder civil e militar da região durante a tomada de poder por parte dos revolucionários de 1930 e durante os primeiros anos do Governo Provisório. Essas novas lideranças, tão logo souberam que a grave crise política entre São Paulo e o Governo Provisório tomara o caminho das armas, passaram a se mobilizar, mostrando ao presidente que ele não estava só, e que esperavam recolocar o “Norte” no mapa político do país. Afinal, a Primeira República significara um período de distanciamento da região do centro político do poder.

Um estado sitiado
Dividido entre apoiar ou combater o gaúcho Getúlio Vargas, o Rio Grande do Sul foi fundamental para conter a luta constitucionalista

Luiz Alberto Grijó

O 9 de julho de 1932 surpreendeu a população gaúcha, até mesmo os aliados do movimento. Muitas de suas lideranças políticas já estavam a par ou mesmo envolvidas nas articulações revoltosas, mas a surpresa foi o momento. O próprio interventor federal no estado, José Antônio Flores da Cunha, vacilava: ora mostrava-se leal a Getúlio Vargas, a quem devia sua nomeação, ora ao Partido Republicano Rio-Grandense (PRR), ao qual pertencia.

O PRR, dirigido por Borges de Medeiros, e o Partido Libertador (PL), de Raul Pilla, formavam a Frente Única. Estruturada a partir de 1929, seu objetivo era, primeiro, apoiar a candidatura de Vargas à Presidência da República e, depois, sustentar a revolta armada de 1930 que o colocou à frente do Governo Provisório.

Com Getúlio na presidência do país, vários membros dos partidos coligados alcançaram cargos importantes ao nível nacional. Do PRR, Oswaldo Aranha se tornou ministro da Justiça; Lindolfo Color, ministro do Trabalho; João Neves da Fontoura, assessor jurídico do Banco do Brasil. Do PL, Joaquim Francisco de Assis Brasil se tornou ministro da Agricultura e João Batista Luzardo, chefe de polícia do Distrito Federal. Mas esta unidade logo começou a se desfazer, e os grupos passaram a se diferenciar pela maior ou menor proximidade com Getúlio Vargas, no plano federal, e com Flores da Cunha, no plano estadual.

Disponível em:
Edição nº 82 - Julho 2012

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