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quinta-feira, 16 de maio de 2013

A Sociedade da Borracha na Amazônia (1870 – 1815)


Durante o período compreendido entre as últimas décadas do século XIX e o primeiro quartel do século XX (1870-1915), ocorreu o processo de expansão e apogeu da economia da borracha na Amazônia. Nesta época, a exploração da borracha silvestre, através do extrativismo, foi possível em razão de diversos fatores. Em primeiro lugar o desenvolvimento da indústria de pneumáticos, que possibilitou uma crescente demanda pelo consumo da borracha nos países industrializados da Europa e Estados Unidos da América e, portanto favoreceu o crescimento da extração e exportação da borracha brasileira. Em segundo lugar, a borracha silvestre brasileira (Hevea Brasiliensis), fez com que a Amazônia em pouco tempo fosse o principal fornecedor de borracha em nível mundial, detendo indiscutível monopólio. Outro fator foi a disponibilidade de mão de obra necessária a extração do látex nas matas amazônicas, através da imigração nordestina que garantia a extração da borracha por um custo baixo. Havia também, a existência do sistema de financiamento da extração e comercialização da borracha amazônica, através do aviamento que, favorecendo o processo de dependência dos seringueiros em relação aos seringalistas, permitia justamente a exportação da borracha pelos portos de Belém e Manaus; além de casas de comércio estrangeiras na Amazônia que, fazendo importação e exportação de produtos, acabava monopolizando a venda da borracha para os mercados europeus e norte-americanos, permitindo o seu escoamento. 

Do sertão seco a mata molhada

A história dos seringais pode também começar pelo Nordeste brasileiro. Pois se considerarmos as figuras humanas que fizeram as feições dos seringais, que construíram nele um modo de vida peculiar, não poderemos deixar de incluir essa região, especialmente algumas partes dela, como o atual estado do Ceará. 

Foi do sertão nordestino, principalmente cearense, árido e seco, que saíram não somente os primeiros aventureiros que estabeleceram os seringais nos altos rios amazônicos, mas também a imensa maioria dos que vieram a trabalhar como seringueiros. 

Quais foram os motivos que levaram a intensa migração de nordestinos para a Amazônia? Essa imigração ocorreu principalmente nos longos períodos de seca na região, como por exemplo, a trágica seca de 1877, que praticamente se estendeu ate 1880. Estima-se que só em 1878 emigraram para a Amazônia em torno de cinquenta mil homens, mulheres e crianças, e outros tantos pereceram de fome, sede e epidemias no Ceará. Outros motivos também contribuíram para esse processo, como a crise na produção algodoeira no início da década de 1870 e a formação de excedentes populacionais no interior das unidades econômicas tradicionais do Nordeste (pecuária tradicional). 

Porém a migração não teve como motor somente “motivos de expulsão” do Nordeste. Afinal, por que a Amazônia, nesse momento, atraiu contingente tão grande de nordestinos? Havia forte atração exercida pela possibilidade de fazer em pouco tempo fortuna nas florestas de heveas. Por outro lado os patrões faziam verdadeiro recrutamento, financiando as passagens e despesas de viagem de vários migrantes e acenando com vantagens e possibilidades de enriquecimento. Depois, é claro, essas despesas eram computadas como dívida para o seringueiro, e constituíam uma forma de prender a mão de obra.
“É sabido como se fazia o povoamento dos seringais: os proprietários desses centros de indústria extrativa iam, anualmente, ao Ceará e outros estados do Nordeste, fazer o recrutamento de trabalhadores. Seduziam-nos, falando-lhes das secas arrasadoras, da penúria em que viviam, da abundancia que facilmente se aufere na floresta das heveas e das siphonias, do conforto que, emigrado, poderiam proporcionar a família... E, assim sugestionados, formavam-se grupos de emigrantes, que eram transportados a capital do estado, onde embarcavam, as centenas, nos porões infectos dos navios”. (Cabral, Alfredo Lustosa. Dez anos no Amazonas (1897-1907). 2ª ed., Brasília: Senado Federal, 1984, p. 23).
Mas afinal, como vivia essa gente no Nordeste? Quem eram esses migrantes, o que faziam e o que fez pensar que seria melhor migrar para a Amazônia? Em primeiro lugar, esses migrantes eram muitos e viviam em condições muito diferenciadas uns dos outros, pois não provinham exclusivamente do sertão e nem exclusivamente das classes mais pobres e atingidas pela seca. Apesar de haver uma pequena parcela de pessoas que iam para a região levando algum recurso na esperança de estabelecerem-se como comerciantes, por exemplo, a maioria dos que chegavam a essas terras seguiam um padrão que aliava a pobreza a ambição de aqui fazer fortuna. A grande maioria dessas pessoas era constituída por homens solteiros, jovens ou adultos, que vinham como força de trabalho, despojada de qualquer condição ou instrumento de produção, engajar-se na empresa extrativista da borracha. Além do mais, vale ressaltar que a ida ao Amazonas não era tida como algo permanente, e sim uma maneira de fazer fortuna e depois retornar para o sertão e à família. 

Porque não se optou pela mão e obra escrava? 

Basicamente, pelo fato de que a tarefa de extração da borracha na floresta amazônica, não conviria a escravidão do negro ou do índio, pois num escravo não se poderia depositar confiança longe das vistas de qualquer fiscalização. Uma vez que para exercer a atividade de seringueiro precisava ter alto grau de autonomia e confiabilidade, já que o trabalho de extração do látex era feito em meio a floresta em localidades muitas vezes distantes das possibilidades de fiscalização dos patrões e seus empregados. 

O Seringal

Para se abrir um seringal não era necessário comprar as terras onde ocorreria a extração do látex, e sim simplesmente ocupá-las. Para esse processo era preciso alguém que conhecesse a floresta e soubesse marcar as “estradas de seringa”, ou seja, um mateiro; uma turma de seringueiros cujo número dependia da quantidade de seringueiras existentes na área; e, sobretudo uma provisão de mercadorias suficientes para sustentá-los durante os primeiros meses, até que um novo carregamento pudesse chegar. Essas mercadorias eram normalmente conseguidas a crédito com as “casas aviadoras” de Belém ou Manaus, ou seus intermediários mais próximos nos seringais já abertos, que também muitas vezes financiavam a vinda de migrantes nordestinos. Assim essas casas aviadoras que forneciam todo o crédito necessário a formação de novas áreas de extração da borracha, ganhando com isso uma relação de dependência com os patrões das áreas que se obrigavam a pagar seus débitos com borracha, requerendo novos créditos para temporadas posteriores. 
A grande maioria dos seringueiros, porém, chegava a seringais já abertos, e com sistema de produção e comércio já bem organizado. Ao chegar no seringal, o “brabo”, como era chamado o seringueiro que não tinha ainda experiência, recebia no barracão os suprimentos para a sua primeira quinzena na mata: farinha, jabá, sal, sabão, querosene para a iluminação, uma espingarda, munição, e os instrumentos para o corte da seringa, a machadinha, tigelas e o balde para colher o leite. Todas essas mercadorias eram anotadas em sua conta-corrente, juntamente com as despesas da viagem, e o desafio era conseguir, mesmo sem experiência, “tirar saldo” nessa conta, ao final da temporada de corte da borracha. 

Durante o período de colheita do látex, entretanto, a vida do seringueiro era bastante trabalhosa. Acordava-se geralmente às duas horas da manhã para começar o corte das arvores, tendo que inicialmente caminhar entre três e seis horas para fazer as incisões na casca das heveas e colocar as tigelinhas abaixo do corte para que o leite caísse dentro. Depois que chegava ao ponto final, o seringueiro ia “quebrar o jejum” e pegar o balde para recolher o leite. Mais uma caminhada, de árvore em árvore, recolhendo o látex das tigelas. E ao final da trilha, sem demora era necessário passar ao processo de defumação da borracha (transformação do leite através de calor em forno especial em uma bola de borracha escura). 

Albuquerque Figueiredo 

O seringal geralmente compreendia grande extensão de terra, bastante variável. A margem do rio que lhe dava acesso, normalmente ficava o Barracão, que podia ser apenas uma construção compreendendo a residência do proprietário, o armazém e o escritório, ou podia ser composto de várias construções separadas. Em torno do barracão não era raro que houvesse alguma criação de gado e porcos para alimentar o patrão e seus empregados, bem como para os dias de festa. Entretanto nesse período o seringal era basicamente uma unidade de produção de borracha que importava praticamente tudo que era necessário para a subsistência dos que aí viviam. A imposição das mercadorias constituía uma forma de impossibilitar aos seringueiros a acumulação de saldos favoráveis em suas contas com o patrão, e deste com as casas aviadoras; gerando lucro ainda maior para os últimos. 
Não podemos deixar de ver o caráter capitalista da empresa da borracha, uma vez que nesse período, os preços subiam a cada safra em proporções assustadoras. O objetivo dos investidores, fossem eles exportadores, aviadores, comerciantes locais ou patrões de seringal, na rede de crédito e dependência, era conseguir o maior lucro possível nessa corrida do ouro negro.
A Crise

Desde que foi descoberta pelos europeus, a borracha prestou-se a múltiplos usos: sapatos e capas impermeáveis, seringas, bolas para jogos, etc. Porém, com a Revolução Industrial que se processou ao longo do século XIX, esta matéria-prima passou a ocupar lugar estratégico para toda a indústria, já que foi usada na confecção das máquinas a vapor, entre outras, tornando seu funcionamento muito mais eficiente. Cedo, portanto, os ingleses perceberam o valor estratégico da borracha, então somente encontrada, em sua espécie mais produtiva e de melhores características para a indústria – a Hevea brasiliensis, na floresta Amazônica. Assim, ao se dar conta do grande valor da borracha, a Coroa Inglesa logo encontrou meio de quebrar o controle brasileiro sobre o produto: tratou de cultivá-las em suas colônias do Oriente. 

No entanto, a domesticação da Hevea brasiliensis foi um processo demorado e burocrático que levou cerca de cinquenta anos desde a obtenção dos primeiros espécimes pelo jardim Botânico Real de Kew, na década de 1850, e o início da produção das primeiras Heveas cultivadas no Oriente, em fins da década de 1890. essas sementes foram plantadas e replantadas, enxertadas e experimentadas até que se conseguiu planta-las em escala comercial no Sri Lanka e, principalmente, na Malásia. O plantio era feito em fazendas no estilo plantation, utilizando-se a mão de obra extremamente barata dos trabalhadores asiáticos. Além do mais, diferentemente dos seringais nativos, nas fazendas de cultivo asiáticas as árvores eram plantadas em fileiras, próximas alguns metros umas das outras, tornando o trabalho muito mais fácil de controlar e, portanto, muito mais produtivo e barato. 

A borracha do Oriente começou a atingir o mercado em 1890, ainda em pequena escala, porém não demorou em ultrapassar a produção amazônica, a partir de 1913. Como consequência da grande quantidade de borracha no mercado, bem como dos menores custos de produção da borracha oriental, o preço do produto começou a cair em grandes proporções. A queda vertiginosa do preço da borracha fez desmoronar toda a estrutura montada sobre o comércio da borracha silvestre na Amazônia, e que somente conseguia sustentar seus lucros, divididos em diversos níveis, por meio do preço elevado do látex. As firmas aviadoras, que praticamente financiavam as safras da borracha, conseguindo, no período de ascensão dos preços, lucros espantosos, foram as primeiras a sentir os efeitos da queda dos preços. E juntamente com as firmas aviadoras, os bancos, casas importadoras e exportadoras, comerciantes atacadistas, entre outros membros da cadeia comercial da borracha, também faliram ou tiveram de enfrentar longa e dura decadência em seus negócios. Contudo, a produção da borracha não parou, e na verdade diminuiu muito pouco nos anos que se seguiram à crise. 

Durante esse período, os seringueiros adquiriram maior autonomia perante os patrões, especialmente nos seringais mais distantes. Porem não houve extinção total do sistema de aviamento, que ficou reduzido a poucas mercadorias de troca, mas mercadorias essenciais. A queda do preço da borracha gerou verdadeira transformação social na Amazônia na criação de um novo modo de vida, com a subsistência por meio da produção agropecuária em pequena escala e do extrativismo (caça, pesca e coleta). Essa transformação também significou que os seringueiros tornaram-se aos poucos uma população tradicional, ou seja, mantêm grande dependência em relação ao território que ocupam. Portanto, para compreender a Amazônia de hoje, é imprescindível o estudo do que aconteceu com a crise da borracha e a transformação dos modos de vida das populações que aqui viviam. 

A Batalha da Borracha: 0 Estado e o Negócio da Borracha 

A batalha da borracha foi um grande investimento feito em conjunto pelos governos do Brasil e Estados Unidos, na região amazônica, com o objetivo de produzir borracha silvestre para suprir os Aliados (bloco liderado pela Inglaterra, França, Estados Unidos e União Soviética), durante a Segunda Guerra Mundial, deste produto estratégico para a guerra. Com a invasão japonesa dos seringais do Oriente, e a posição do Japão favorável à Alemanha e à Itália, os estoques de borracha dos Aliados começaram a diminuir muito, e a produção brasileira no mercado não era suficiente para a demanda. 

Desse modo, para aumentar a produção em pouco tempo era necessário muito mais que o aumento do preço da borracha. Entre outras iniciativas adotadas, como o estabelecimento do monopólio estatal sobre o comércio da borracha, foi imprescindível a mobilização de milhares de migrantes nordestinos rumo a Amazônia, os chamados “soldados da borracha”. 

A forma de encaminhamento dos novos migrantes aos seringais agora obedecia a um contrato-padrão e a uma série de medidas que visavam aparentemente assegurar alguns direitos aos seringueiros, e muitos aos patrões, agora chamados de “seringalistas”. Havia um serviço de saúde e higiene, um kit composto de rede, sandálias, prato, copo, etc., e até treinamento para os futuros seringueiros em Belém do Pará. Além dessas vantagens pecuniárias, havia outras que eram prometidas pelo governo, como: isenção do serviço militar obrigatório, pagamento de pensão a família em caso de morte ou invalidez, contrato de dois anos, entre outras. 



5 comentários:

  1. Muito bom essa pagina estou estudando geografia

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  2. Muito interessante o texto. Sou descendente de seringueiros e minha vó me falou que ela ouvia histórias em que até o sobrenome das pessoas "eles" mudavam. Inclusive os antepassados do meu avô tiveram novos documentos já alterados. Será que vocês sabem de alguma história nesse sentido?

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